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Pelos que tombaram pela pátria
Em 9 de Abril de 2008 completaram-se noventa anos sobre a Batalha de La Lys. Esta batalha deu-se durante a Primeira Guerra Mundial, na região da Flandres, na Bélgica, e nela se defrontaram tropas alemãs e tropas britânicas — nas quais estavam integrados vinte mil soldados do Corpo Expedicionário Português. Nessa batalha, entre mortos, feridos, desaparecidos e prisioneiros houve sete mil e quinhentas baixas entre os soldados portugueses. Tratou-se da maior catástrofe militar portuguesa depois da batalha de Alcácer-Quibir, em 1578.
Para a Primeira Guerra Mundial foram mobilizados quase duzentos mil portugueses, dos quais morreram dez mil. Entre eles contaram-se três mealhadenses.
Quarenta e três anos depois, tinha início um novo conflito militar envolvendo tropas portuguesas. Foi a Guerra Colonial, também chamada Guerra do Ultramar. Tratou-se de um conflito militar que roubou a vida a nove mil militares portugueses, dezassete dos quais do concelho da Mealhada.
Para perpetuar a memória dos mortos na “Guerra contra a Alemanha” — designação dada, na altura, à Primeira Guerra Mundial —, foi construído, em cada sede de concelho do país, um monumento onde foram inscritos os nomes dos militares de lá naturais que tombaram nesse conflito. No concelho da Mealhada, o monumento foi erigido no Jardim Municipal Costa Simões.
Há alguns anos, não sabemos precisar quantos, mas não serão muitos, na base deste monumento foram colocadas quatro pedras com a inscrição dos nomes dos dezassete militares do concelho da Mealhada que morreram em África, na Guerra Colonial. Algum tempo depois, na Antes, na rotunda da estrada para Sernadelo, foi colocado um conjunto escultórico de metal, em homenagem ao único militar da freguesia da Antes morto em África durante essa guerra. Com objectivo semelhante foi colocada, no Jardim Público de Barcouço, uma lápide dedicada aos mortos no Ultramar. A cerimónia do descerramento dessa lápide ocorreu no passado sábado, 12 de Abril, dia em que se realizou, nesta povoação, o segundo convívio de militares do concelho da Mealhada que combateram na Guiné-Bissau.
São muitas as dezenas de convívios de militares participantes na Guerra Colonial, que se realizam na Mealhada. Na Internet há vários sítios que divulgam esses encontros. Eles, de certo modo, funcionam como meio de exorcizar angústias, medos e frustrações, por meio do convívio entre pessoas que, juntas, ultrapassaram dificuldades, presenciaram coisas e factos muitos dos quais traumatizantes e, porventura, inimagináveis para tantos de nós. Pessoas que criaram, entre si, laços de cumplicidade, de solidariedade, de amizade. Reúnem-se na Mealhada, acreditamos, por uma questão de centralidade geográfica e de oferta de restauração.
A construção de um monumento artístico na cidade da Mealhada, em homenagem aos combatentes da Guerra Colonial — a todos eles —, constituiria, também, uma forma de reconhecimento aos grupos de antigos militares que aqui se reúnem, pela preferência que dão ao concelho. Como aqui se concentram, aqui teriam um lugar digno, especial, para homenagear os que, como eles, estiveram envolvidos em conflitos militares pela pátria. Uma iniciativa que, certamente, teria o apoio das associações de veteranos de guerra e constituiria um gesto de justiça.
A existência desse monumento seria uma forma de lembrar a Guerra Colonial e as repercussões que teve na nação portuguesa. A nosso ver tem sido um acontecimento histórico muito menosprezado – mesmo ao nível da busca de justificações históricas para o 25 de Abril de 1974. Nas escolas, segundo constatamos, raramente tem havido tempo para abordar o assunto. E, na televisão, a educadora do povo, mesmo os bons trabalhos de divulgação do tema – como a reportagem de Joaquim Furtado, na RTP – são bastas vezes preteridos em favor de jogos de futebol e de telenovelas de qualidade duvidosa. A Guerra Colonial ainda não foi tema devidamente tratado na sociedade portuguesa e corre o risco de vir a ser completamente ignorada pelas próximas gerações.
Deixamos a sugestão da construção de um monumento, convencidos de que seria uma boa medida…
E como as sugestões não se confundem com pedidos, renovamos um que nos parece medida de boa governança, apesar da simplicidade. No monumento aos mortos na Primeira Guerra Mundial, a que aludimos, e que se encontra no Jardim Costa Simões, em consequência, talvez, do excesso de zelo posto na limpeza da pedra que o constitui as letras que lá estão gravadas acabaram por perder a tinta e ficar sumidas. É possível lê-las, mas com grande dificuldade. Seria importante, por isso, reavivar as letras dos nomes dos três militares. Tinta preta e mão cuidadosa resolveriam o problema. Seria um acto de justiça.
Numa das próximas edições do Jornal da Mealhada daremos notícia dos discursos solenes proferidos por ocasião do trigésimo quarto aniversário da Revolução dos Cravos, no próximo dia 25 de Abril. Serão feitas referências várias, mais ou menos poéticas, colocando a tónica na liberdade, no respeito por direitos e deveres fundamentais das pessoas, na qualidade dos políticos e da democracia. Alguns farão referências ao drama que foi a Guerra Colonial, que se arrastou por treze anos, longínqua, no espaço e no tempo, mas muito próxima. Uma guerra que, trinta e quatro anos depois, mantém abertas feridas e sofre da injustiça de não ser devidamente tratada na história de Portugal do século XX. Seria bom que alguém usasse do seu ‘direito de antena’ para anunciar alguma coisa que possa contrariar essa injustiça.
Editorial do Jornal da Mealhada de 16 de Abril
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