quarta-feira, 14 de maio de 2008

Mercurii dies

[531.]

Os jovens e a (desacreditada) política

Na sequência da intervenção que proferiu, no parlamento, na sessão comemorativa do 25 de Abril, o Presidente da República juntou, na segunda-feira, 12 de Maio, trinta dirigentes de organizações de juventude com o objectivo de reflectirem sobre o afastamento dos jovens em relação à vida política e sobre os meios necessários à resolução do problema.
Nas conclusões do estudo encomendado pelo Chefe de Estado à Universidade Católica que serviu de base à referida intervenção, está demonstrado que o nível de participação dos jovens portugueses na vida política é a mais baixa da União Europeia. Segundo Cavaco Silva este facto é preocupante, na medida em que pode hipotecar o futuro do país e a continuidade do sistema político democrático em Portugal.
“Estamos ou não estamos satisfeitos com a participação, com o envolvimento, dos jovens portugueses na política local, na política nacional, na política internacional? Por que é que a política não suscita o interesse dos jovens?”. Estas foram duas das perguntas lançadas para o debate pelo Presidente da República.
Os jovens portugueses são, neste momento, os mais bem formados de sempre, pelo menos teoricamente. Fazem parte, também, da primeira geração de portugueses com mentalidade europeia, da mais sensível à ecologia, da mais informada, viajada e com mais possibilidades de estudos no estrangeiro. No entanto, de uma maneira geral, não participam na vida política. Aliás, parte significativa dos jovens portugueses, já aqui o dissemos, não só se afasta da política como até censura os seus pares que militam em partidos políticos ou participam em iniciativas de outras organizações políticas.
As informações sobre a vida interna dos partidos políticos e a constatação da existência de promessas eleitorais não concretizadas serão, na nossa opinião, os factores que mais têm contribuído para o afastamento dos jovens.
A qualidade e a credibilidade dos políticos portugueses é, muitas vezes, apontada, em certos casos injustamente, como a principal razão para o estado económico e social do país. Os jovens, ao verem desigualdades sociais, desemprego — mesmo de cidadãos com habilitações profissionais qualificadas —, aumento dos custos de vida, condenam ao ostracismo os políticos e a política. Este é, certamente, factor determinante para o seu alheamento em relação à gestão da coisa pública. Acresce a isto a ideia de um anti-parlamentarismo militante, herdada do Estado Novo e inspirada pela instabilidade da Primeira República, como forma de dar resposta às inquietações da juventude.
As juventudes partidárias, por outro lado, também têm dado um contributo forte para o afastamento dos jovens em relação à política. A imagem que eles têm dessas organizações — e também aqui nem sempre com justiça — é a de uma antecâmara do poder, de uma espécie de escola de carreirismo político-partidário, de sindicato de lugares, com protagonistas que têm, aos vinte anos, já, os mesmos vícios que caracterizam os políticos profissionais de cinquenta ou sessenta.
As novas correntes de pensamento sobre as questões da cidadania apontam, hoje em dia, para outras possibilidades de participação política, longe da militância partidária, da vida política institucionalizada. Numa lógica glocal — pensar global, agir local — os jovens portugueses mostram preferir assinar petições na Internet, associar-se a acções de voluntariado — umas tão simples como as do Banco Alimentar ou da Liga Portuguesa Contra o Cancro, outras tão complexas como as dos Leigos para o Desenvolvimento —, manifestar-se em blogues ou silenciosamente. Consideramos, no entanto, que eles não são menos interessados na vida da sociedade que os rodeia do que a geração dos seus pais ou dos seus avós.
O que é que pode fazer-se para inverter esta tendência de alheamento? Não haverá uma fórmula mágica, mas, estamos certos, há caminhos que interessa tentar trilhar. O primeiro deles é o de repensar e moralizar o nosso sistema político e a prática política. Continuando a dar sinais aos partidos e aos políticos de que não serão beneficiados se prosseguirem no caminho do cata-ventismo. Por outro lado, consideramos importante dar aos jovens autarcas, por exemplo, condições para poderem apresentar os seus pontos de vista, as suas propostas, e para o fazerem genuinamente, em contacto directo com os outros jovens, permitindo e fomentando a participação esclarecida de todos.
Realizando-se eleições autárquicas dentro de dezoito meses, fará sentido que os dirigentes partidários concelhios diligenciem para que aumente o número de jovens nas listas de candidatura e, mais importante ainda, permitam que sejam eleitos. No presente mandato, o número de jovens eleitos deve envergonhar muita gente… Nas juntas de freguesia do concelho da Mealhada, em vinte e quatro eleitos apenas um tem menos de trinta anos — e, se calhar, só dois têm menos de quarenta. Nas assembleias de freguesia, apenas catorze dos sessenta e oito eleitos terá menos de trinta anos. Sem motivo para se envergonhar está a Assembleia de Freguesia de Ventosa do Bairro que, em sete eleitos, tem cinco pessoas com menos de trinta e cinco anos. Se continuarmos com a análise para a Câmara Municipal, contamos apenas um vereador, em sete, com menos de quarenta anos. Na Assembleia Municipal da Mealhada, em trinta e um eleitos, apenas seis terão menos de trinta e cinco anos. Diga-se que, a talhe de foice, e porque não é menos importante, se fizéssemos a mesma contabilidade relativamente ao número de mulheres presentes nos órgãos autárquicos concelhios, ainda nos sentiríamos mais envergonhados…
O problema maior, relativamente à falta de participação dos jovens, é o da própria sustentabilidade do sistema democrático. Se observarmos, atentamente, os nossos jovens, as suas relações interpessoais, no funcionamento dos grupos de que fazem parte, verificamos que o sistema democrático — a decisão da maioria e a sua aceitação por parte de quem perdeu —, já não é natural, já não é o sistema preferido de relacionamento e de resolução de problemas, quantas vezes de conflitos. Muitos jovens consideram que a democracia não resulta e não resolve os problemas comuns. E tal ideia tende a crescer. E isto, sim, é grave!

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