O ano de 2009…
O caminho é estreito mas existe
Classificado, antes mesmo de se iniciar, como annus horribilis, 2009 começou há poucos dias mas tem já, sobre si, uma carga bastante pesada. As perspectivas económicas não são promissoras, há indicadores que prenunciam o aumento do desemprego, da pobreza e da exclusão social. Será, assim o dizem os analistas, o ano da crise. No seu discurso de Ano Novo, o Chefe do Estado, Prof. Cavaco Silva, exortando os portugueses no sentido de não se deixarem dominar pelo desânimo disse: “Não tenham medo!”. No mesmo sentido, à sua maneira, vem a tirada do grupo de humoristas ‘Gato Fedorento’ sugerindo a passagem directa do ano de 2008, para o ano de 2010, evitando assim o ano de 2009.
A ideia de classificar um ano do calendário como horribilis — horrível — ou mirabilis — milagroso — decorre da tradição poética britânica e ganhou maior popularidade quando a monarca de Inglaterra, Isabel II, declarou que os factos do ano de 1992, na família real britânica, tinham feito deste um annus horribilis. O antigo secretário-geral das Nações Unidas Kofi Annan com o mesmo epíteto classificou o ano de 2004 — aludindo à catástrofe do tsunami na Ásia e, também, às suspeitas de corrupção nas estruturas internas da ONU. Também o ano de 2007 foi considerado horribilis por Juan Carlos, rei de Espanha — devido a problemas do foro intimo da família real, aos incidentes separatistas anti-monárquicos que se verificaram no seu país e ao conflito entre ele e o Presidente República da Venezuela.
Sem o dizer textualmente, Cavaco Silva, Presidente da República, classificou também o ano que agora começa como um annus horribilis. Aguardava-se do Chefe do Estado português, dias depois do puxão de orelhas que deu aos deputados da Assembleia da República, uma declaração de Estado com uma análise ao trabalho do Governo. Cavaco Silva não o fez — criticou apenas os “oito anos consecutivos de afastamento em relação ao desenvolvimento médio dos parceiros europeus”, fazendo sobressair a verdade que entendeu ter de ser dita: “Portugal gasta em cada ano muito mais do que aquilo que produz”. O Presidente da República preferiu dirigir “uma palavra especial de solidariedade a todos os que se encontram em situações particularmente difíceis”. Palavra endereçada, de forma sublinhada, aos que perderam o emprego e rendimentos, aos jovens que não conseguem o primeiro emprego, aos pequenos comerciantes, e aos agricultores.
Num discurso particularmente escuro, que fomenta o cepticismo, e que é, até, na nossa opinião, angustiante, Cavaco Silva declarou sentir-se impelido a dizer a verdade — uma verdade que custa ouvir: “2009 vai ser um ano muito difícil!”. “A verdade é essencial para a existência de um clima de confiança entre os cidadãos e os governantes. É sabendo a verdade, e não com ilusões, que os portugueses podem ser mobilizados para enfrentar as exigências que o futuro lhes coloca”, disse Cavaco. “As ilusões pagam-se caro. O caminho é estreito, mas existe. E está ao nosso alcance”, acrescentou.
Sublinhamos, ainda, as palavras que Cavaco Silva dirige aos partidos políticos. Lembramos que se realizarão nos próximos doze meses três actos eleitorais — a eleição para o Parlamento Europeu, as eleições autárquicas e as legislativas. Sendo as duas últimas de especial relevância politica e económica, e mais susceptíveis à demagogia e ao populismo. Cavaco é muito directo: “Os portugueses gostariam de perceber que a agenda da classe política está, de facto, centrada no combate à crise. Não é com conflitos desnecessários que se resolvem os problemas das pessoas”.
Cavaco Silva, pessoa a que já alguém chamou, um dia, timoneiro e homem do leme, garante estar atento, mas não nos tranquiliza. Sem pretendermos colocar no mesmo plano o discurso do Chefe de Estado e o do Gato Fedorento, lembramos que Cavaco Silva exprime uma ideia semelhante à do referido grupo humorístico: “O futuro é mais do que o ano que temos pela frente. O futuro será 2009, mas também os anos que a seguir vierem”.
Condenados a atravessar este ano, mais ou menos angustiados, com mais ou menos motivos para ter esperança, lembremos que 2009, para além de ser o Ano Internacional da Astronomia, é, note-se bem, o Ano Europeu para a Criatividade e Inovação. Criatividade e inovação que, em época de crise, tão necessárias são, tanto jeito dão, tantas oportunidades poderão criar e tantos sucessos podem proporcionar.
Não tenhamos medo! O caminho é estreito mas existe, frisou Cavaco Silva. Aceitemos trilhá-lo, com criatividade e sentido de inovação.
Editorial do Jornal da Mealhada de 07.01.09
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