D'existir
Na
mesma semana, Adriano Moreira - histórico e nonagenário senador da República -
enunciou o perigo de uma "fadiga fiscal" nos cidadãos contribuintes,
e o chefe do Governo, Pedro Passos Coelho, no epílogo da quinta avaliação da troika,
anunciou as medidas que visam compensar o chumbo do Tribunal Constitucional
quanto aos cortes de subsídios de Natal e de Férias. A contradição entre os
dois discursos é total e absoluta. Entre outras medidas, o primeiro-ministro
informou que os portugueses vão passar a descontar do seu salário uma maior
fatia para a Segurança Social. Ou seja, vão ter menos dinheiro disponível no
seu rendimento efectivo.
O discurso do
chefe do Governo foi pelo próprio "esmiuçado" no Facebook... e
confessada a alegada "tristeza" que sentiu ao proferi-lo.
A crise
económica e financeira que a Europa atravessa está a ensinar-nos que é grande a
distância entre os discursos políticos que se proferem e os discursos que os
políticos gostariam de proferir. A verdade não pode ser toda dita, por que se
não os mercados reagem e as pessoas entram em colapso, em desespero. Mas não se
pode mentir, porque isso traz problemas de credibilidade perante os
financiadores. O dilema não podem deixar de ser visto como terrível. Não
acreditamos que os políticos gostem de dar más notícias, antes pelo contrário,
pelo que, com mais ou menos sinceridade, não consta que masoquismo seja
característica dos políticos hodiernos.
Vivemos tempos complexos, e estamos enleados numa teia de que não nos apercebemos. Como um nadador inconsciente, estamos no meio do canal e não nos resta mais nada senão nadar. Podemos nadar para a frente, ou nadar para trás. É exactamente a mesma coisa... Achamos que já não temos mais forças, mas não temos alternativa. Estamos convencidos de que não vamos aguentar mais, mas só nos resta nadar. Não há ajudas, não há salva-vidas, podemos parar e boiar durante um bocado para descansar, mas não dá para sair dali.
Não vale a pena
pensar no que poderia ser diferente. Portugal, neste momento, não tem outra
solução se não continuar a nadar. Nestes momentos pode pensar-se em desistir. E
afogarmo-nos. Mas nem isso resolve nada, porque continuaremos cada vez pior.
Podemos gritar por ajuda, e fazer chantagens... mas isso só nos faz perder
energias.
Não sabemos se
falta muito para chegar a terra, falta o que faltar. Não há hipótese de
desistir, só uma alternativa nos resta e essa é a de existir. Continuaremos
a existir. Teremos de continuar a lutar, teremos de continuar a fazer
sacríficios, teremos de continuar a sofrer e a prescindir dos sonhos mais
ambiciosos. Temos maus políticos? Temos. Fizemos más opções? Fizemos! Falhámos
em muitas escolhas? Claramente. Mas não há hipótese de sair daqui. Podemos
emigrar, mas o mundo todo está em crise. Podemo-nos revoltar e linchar os
responsáveis, mas não vai ser esse sangue que nos vai alimentar e saciar a fome
que já se vive.
No final fazemos
contas.
No final faremos
os julgamentos e condenaremos os responsáveis.
É
escuro o cenário? É, de facto. Estaremos a ser pessismistas? Não, antes
peloc ontrário: Não é pessimismo reconhecer que estamos mal. Não é pessimismo
observar que não temos outra alternativa. É clarividência. E muita esperança. Muita
Esperança no futuro, muita esperança nos que virão depois de nós e com o nosso
testemunho e a nossa memória não repetirão os erros do passado e não se
abalançarão a atravessar o canal sem pensar no que vai custar.
Editorial do Jornal da Mealhada de 12 de setembro de 2012
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